SÃO PAULO – A decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de elevar a taxa básica de juros, Selic, em 0,75 ponto percentual, a 2,75% ao ano, não será o bastante para acabar com a pressão sobre a moeda brasileira, mas já afasta a hipótese de uma disparada do câmbio até R$ 6,00.
Essa é a opinião de analistas como Faria Jr., diretor da Wagner Investimentos, para quem o dólar deve ir a R$ 5,20 até o final do ano com o ciclo de aperto de juros levando a Selic a pelo menos 4,5% ao ano e diante de uma aceleração na vacinação contra o coronavírus.
“Acho muito difícil, com essa decisão do Banco Central, que o dólar chegue a R$ 6,00, mas cair de R$ 5,00 também é improvável a menos que o governo mostre um compromisso sólido com o ajuste fiscal, algo que não vejo acontecer”, afirma.
Para Faria Jr., os 45 dias entre esta reunião do Copom e a próxima serão essenciais para poder prever onde fechará o câmbio, pois o País terá semanas críticas em número de casos e mortes por coronavírus. Ontem, o Brasil registrou uma média móvel de mais de 2 mil óbitos por causa da Covid pela primeira vez desde o início da pandemia.
“O maior risco do câmbio para este ano é uma piora grande no cenário do coronavírus. Isso forçaria o governo a aumentar e estender o auxílio emergencial para o segundo semestre sem ter espaço para isso no Orçamento”, avalia, lembrando que quanto mais crescem os números de casos mais medidas de isolamento social são necessárias e que isso acaba reduzindo a renda da população.
Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating, diz que, apesar da decisão do Copom ter surpreendido e reduzir as pressões cambiais de curto prazo por melhorar as condições de carry trade, não há ainda uma mudança significativa o bastante no cenário para se revisarem projeções do câmbio ao fim do ano.
“Nosso juro real continua inexistente e o nosso risco País medido pelo Embi+ ainda está na casa dos 300, o que é muito baixo, pagamos só 3% acima dos EUA. O Brasil é um País de grandes oportunidades, mas pontuais, em setores específicos como saneamento. Não é um País para colocar dinheiro em títulos do Tesouro e descansar”, explica.
Agostini também prevê que o dólar encerrará o ano cotado a R$ 5,20 e acredita que as sinalizações do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês), de que irá manter os juros nos Estados Unidos próximos de zero até 2023 são positivas para o real, mas não o suficiente para atrair maciços investimentos estrangeiros que levariam o câmbio a ficar abaixo de R$ 5,00.
Nas próximas semanas, Agostini entende que o Banco Central irá ajustar sua política cambial e ritmo de leilões de swap por indicadores como o fluxo cambial semanal e a inflação no atacado medida pelos Índices Gerais de Preços (IGPs) da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
“É preciso combater a inflação no atacado. Daqui para frente a intervenção pode vir em menor grau, mas isso depende do pass-through [efeito cambial nos preços dos produtos de um país] que será auferido a partir de agora”, ressalta.
A opinião de Faria Jr. é que o BC fará tudo a seu alcance para conter a inflação e como o aumento de preços atual está atrelado à inflação de alimentos por causa da valorização das commodities em meio ao dólar mais alto, não há forma de fazer isso sem que o dólar se acomode em algum patamar abaixo de R$ 5,50.
Em relatório, o Citi destacou que o começo de um ciclo de alta de juros no Brasil vai prover uma “nova camada de suporte” à taxa de câmbio, o que, combinado com a reação de moedas emergentes à decisão do Fed de quarta-feira, deve resultar em fortalecimento adicional da divisa brasileira. Eles ainda mantêm estimativa de Selic em 5% ao fim do ano.
Cabe destacar que, na véspera, por conta da decisão do Copom, o real foi uma das poucas moedas emergentes que fecharam em alta, ainda que se afastando das máximas do dia. O dólar fechou em baixa de 0,30% ante o real, a R$ 5,569 na compra. “A surpresa ‘hawkish’ (do Banco Central) é um relevante catalisador de curto prazo para uma melhor ação de preço do real”, disseram os profissionais.
Por outro lado, mesmo após a decisão do Copom, o UBS revisou para cima as projeções para o dólar, destacando que o real continua a se desviar de tradicionais elementos macro e de seus pares, e apenas uma vacinação em larga escala e sinais claros de compromisso com reformas por parte de todas as esferas do governo podem reverter pelo menos uma parte das posições vendidas na moeda doméstica detidas por locais e estrangeiros.
O banco suíço elevou de R$ 4,95 para R$ 5,30 a expectativa para o dólar ao fim de 2021, enquanto a projeção para 2022 passou de R$ 5,05 reais para R$ 5,15.
Segundo Fabio Ramos e Roque Montero, que assinam o relatório, mesmo a aprovação recente da PEC Emergencial – que estabelece gatilhos contra aumentos de gastos – foi vista pelos mercados como “pouco demais, tarde demais”, devido à sua aprovação tardia e aos novos desafios. “Com viés limitado de alta para rendimentos dos Treasuries, a menos que a inflação convença os mercados, os drivers domésticos vão dominar o destino do real”, apontaram, lembrando que há tempo restrito neste ano para progresso nas reformas, dado que, para eles, em novembro começa o período pré-eleitoral.
“Avaliamos que o cenário atual é uma espécie de equilíbrio instável. Se os obstáculos atuais diminuírem nos próximos trimestres e os mercados externos permanecerem razoavelmente favoráveis para emergentes como o Brasil, o real provavelmente se voltaria para seus drivers tradicionais”, disseram. “Caso contrário, podemos ver mais ondas de deterioração, como as das últimas semanas.”
(com informações da Reuters)
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