Dólar em tempos de guerra: proteção ou risco para o investidor brasileiro?

A soberania do dólar e sua imagem de porto seguro vinham sendo colocadas em xeque nos últimos meses, especialmente após a guerra tarifária iniciada pelo ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. A desconfiança aumentou tanto que, na semana passada, gestores de fundos reduziram sua exposição à moeda americana para o menor nível em duas décadas, segundo pesquisa do Bank of America.

No entanto, diante do recente ataque dos EUA ao Irã no fim de semana, o dólar voltou a reagir nos mercados globais. O DXY – índice que mede o desempenho do dólar frente a uma cesta de moedas fortes – subiu 0,50% nesta segunda-feira (23). No acumulado dos últimos cinco dias, o avanço é de 1,14%.

“Os ganhos da semana passada durante os ataques de Israel sugerem que os investidores não descartaram completamente o papel do dólar como um porto seguro”, explicou o banco Standard Chartered em relatório publicado nesta segunda.

E, em momentos de conflito, a “verdinha” costuma brilhar. Em outubro de 2022, oito meses após a invasão da Ucrânia pela Rússia, por exemplo, o DXY acumulava alta de 12%, atingindo o maior nível desde junho de 2002. Desta vez, o comportamento da moeda pode seguir o mesmo roteiro, segundo Rogério Mauad, especialista em mercado financeiro da Fipecafi.

A ameaça do Irã de fechar o estreito de Hormuz – por onde passa cerca de 20% do petróleo mundial – como resposta aos ataques eleva o risco de um choque de oferta, pressionando o preço do barril, segundo o especialista. Isso pode gerar um efeito inflacionário em escala global e forçar o Federal Reserve (o banco central dos EUA) a retomar a alta dos juros para conter as expectativas de inflação, respingando no dólar.

“Com a alta nas expectativas de inflação, os juros tenderiam a subir nos Estados Unidos, o que fortaleceria o dólar frente às principais moedas”, falou Mauad. “O dólar já está subindo cerca de 1,5% em relação ao iene japonês, além de avançar frente ao euro, à libra e a outras moedas relevantes”, falou.

Longo prazo: reação limitada, segundo analistas

Apesar do risco de alta nos preços do petróleo e de valorização pontual do dólar com o avanço do conflito, alguns especialistas mantêm uma visão mais cautelosa sobre os impactos de longo prazo. Paulo Feldmann, professor da FIA Business School, avalia que choques no mercado de petróleo, mesmo quando ocorrem, tendem a ser resolvidos rapidamente – o que limita tanto os efeitos inflacionários quanto o fortalecimento sustentado da moeda americana.

“É claro que uma disparada no preço do petróleo provoca inflação no mundo todo, inclusive no Brasil. Mas, nas crises recentes envolvendo interrupções na produção – seja por ataques ou decisões políticas de países produtores – o problema se resolveu em pouco tempo. Não é do interesse nem mesmo dos produtores manter restrições por muito tempo, já que isso reduz suas receitas”, explicou Feldmann.

Com relação ao dólar, Feldmann também não vê espaço para uma valorização duradoura. “Um fortalecimento pontual até pode ocorrer, mas não deve se sustentar. A economia americana tem dado sinais de fraqueza, e há risco de inflação interna nos próximos meses, o que reduz o apelo do dólar como ativo de proteção”, afirmou. “Se houver valorização, deve durar poucos dias e logo voltar ao patamar atual.”

Nesse cenário, ele acredita que o ouro pode ganhar protagonismo. “Historicamente, o ouro se fortalece em momentos de crise. É provável que investidores busquem essa alternativa mais segura caso a guerra se prolongue.”

Vale investir agora?

Mas o que tudo isso significa, na prática, para quem está no Brasil tentando decidir se deve ou não investir em dólar agora? Lembrando que, na semana passada, a moeda caiu abaixo dos R$ 5,50 pela primeira vez desde outubro e seguia na casa dos R$ 5,53 nesta segunda-feira.

Para Rodrigo Sgavioli, head de alocação do research da XP, essa queda pode representar uma boa oportunidade de entrada – mas não deve ser o fator principal na hora de dolarizar parte dos investimentos.

“O câmbio pode funcionar como um empurrão, mas não deve ser o principal fator na decisão”, falou. O mais importante, segundo ele, é a estratégia de diversificação internacional, que ajuda a mitigar riscos locais e expõe o investidor a diferentes geografias.

Essa parcela internacional do portfólio pode variar de 5% a 20%, dependendo do perfil do investidor, de acordo com o especialista. ”Se o investidor já atingiu esse patamar, não precisa ampliar só porque o dólar caiu. Mas, se ainda está abaixo, pode ser um bom momento para acelerar esse processo.”

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