Haddad defende moeda comum, não única, com Argentina, e fala em novo meio de pagamento para recuperar mercado

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), e o ministro da Economia da Argentina, Sergio Massa, propuseram, em memorando conjunto assinado nesta segunda-feira (23), a simplificação e modernização de acordos de pagamento em moedas locais.

O acerto ocorre durante a primeira internacional do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) desde que tomou posse para seu terceiro mandato no comando do país, em 1º de janeiro de 2023. O mandatário é acompanhado por comitiva de ministros em Buenos Aires.

A assinatura do documento dá início a estudos técnicos de representantes dos governos dos dois países na busca pela construção de uma unidade comum de troca para transações comerciais e financeiras. A nova moeda comum não substituirá as divisas locais – casos do real no Brasil e do peso na Argentina.

“Propõem que a assinatura do presente instrumento dê início a ações destinadas a superar barreiras e dinamizar o comércio bilateral, a simplificar a modernizar acordos de pagamento em moedas locais e a fortalecer a integração regional”, diz o texto.

O documento traz o compromisso de expansão do uso de moedas locais, com a intensificação das negociações entre os bancos centrais e outros órgãos responsáveis para aperfeiçoar o Sistema de Pagamentos em Moeda Local (SML), com a ampliação de seu uso e escopo, visando um comércio com menos obstáculos.

“As partes acordam em avançar em acordos e instrumentos que facilitem o livre fluxo de divisas entre os países, sob um esquema compatível com a estabilidade financeira e macroeconômica”, diz.

A ideia da aproximação é inverter a tendência de perda de participação do comércio entre os dois países nos respectivos Produtos Internos Brutos (PIBs) também a partir de avanços num programa de financiamento de exportações recíproco e reduzindo a dependência no dólar.

No caso brasileiro, o programa busca simplificar o ambiente para as empresas interessadas em exportar. Já do lado argentino, o objetivo é atenuar o efeito gerado pela falta de divisas internacionais e aumentar o ritmo de abastecimento das cadeias de valor, reduzindo o peso do comércio bilateral sobre as reservas cambiais – aliviando a pressão sobre o banco central local para fechar as contas.

Segundo Haddad, a demanda apresentada pelos presidentes Lula e Alberto Fernández foi de criação de um meio de pagamento comum entre os países.

“Nós não estamos defendendo moeda única. Estamos defendendo uma engenharia que não seja o pagamento em moedas locais, que não funcionou, mas não chegue a um estágio de unificação monetária, como é o caso do euro. Mas busque uma forma de integração financeira”, afirmou.

Uma preocupação entre agentes econômicos é que o acordo amplie possível “contágio” da crise econômica argentina para a brasileira e que riscos associados à operação afetem sobretudo as empresas do setor financeiro envolvidas – no caso brasileiro, o Banco do Brasil.

“O Banco do Brasil não vai tomar risco nenhum desta operação de crédito de exportação”, assegurou o ministro brasileiro. “Nós vamos ter um fundo garantidor, que é um fundo soberano, que vai garantir as cartas de crédito emitidas pelo Banco do Brasil para os exportadores brasileiros”.

Segundo ele, o movimento é fundamental para o avanço da integração regional e na recuperação de mercado pelas empresas brasileiras. “Hoje, o fechamento da conta externa entre Brasil e Argentina é de 30 dias. O que está acontecendo é que quem está dando crédito de médio prazo para a Argentina está levando um mercado que seria naturalmente de produtos manufaturados brasileiros”, disse.

“Nossas exportações de manufaturados são voltadas em geral para a América do Sul. Se começarmos a perder esse espaço, a região toda vai se desindustrializar, como vem acontecendo”, continuou.

Segundo o ministro argentino Sergio Massa o acordo faz parte de uma agenda mais ampla em discussão, que envolve integração energética entre os países e o envio de gás de Vaca Muerta, localizado na província de Neuquén, na Patagônia argentina, para o Brasil.

“Imaginamos que, no regime de garantias, podemos trabalhar com mecanismos de certificações de gás futuro como um mecanismo que, de alguma maneira, gere expectativas positivas a respeito do processo de ampliação de capacidade instalada industrial ao Brasil e sirva à Argentina para começar a abrir esse mercado, entendendo que a Bolívia está em declínio e que estamos frente a uma enorme oportunidade – Brasil de acessar gás mais barato do que hoje compra da Bolívia; e Argentina de abrir um mercado com volume que até aqui só pode despachar ao Uruguai e ao Chile”, afirmou.

“Temos o desafio de nos reencontrar e recorrer a um caminho de recuperação de um comércio bilateral que, em algum momento, foi muito forte em relação ao tamanho do produto bruto entre Argentina e Brasil. Nos últimos 10 anos, perdemos quase 40% do comércio bilateral”, salientou.

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