Apesar de toda desconfiança, o governo do presidente argentino Javier Milei completou seis meses de mandato, implementando uma agenda de reformas, que busca tirar o país do buraco em que se encontrava, com inflação galopante e saída de recursos externos.
Como consequência, isso vem ajudando o peso argentino a registrar uma desvalorização pouco inferior à apresentada pelo real, no acumulado de 2024.
De acordo com dados do Banco Central do Brasil, compilados pela Austin Rating, do começo deste ano até o dia 21 de junho, o real se desvalorizou 11,0% em relação ao dólar, enquanto o peso argentino perdeu 10,8%.
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Para entender porque o real se desvaloriza mais do que o peso argentino em 2024, em relação ao dólar, o InfoMoney detalha a seguir, em 5 pontos, as principais razões. Confira em detalhes, a seguir, quais são:
Real se desvaloriza mais que peso argentino
Entre os fatores que levam a moeda brasileira a sofrer uma desvalorização superior a do país vizinho estão questões internas, sobretudo as preocupações fiscais, bem como as externas, relacionadas aos juros nos EUA e riscos geopolíticos.
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1. Risco fiscal no Brasil
Inicialmente, a perda de valor do real frente ao dólar encontra explicações internas, sobretudo por conta do risco fiscal – ou seja, um possível descontrole das contas públicas.
Trocando em miúdos, o governo gasta mais do que arrecada. Então, para fechar as contas, o país emite mais dívida, que, por conta dos juros elevados, está mais “cara” e pode comprometer a capacidade de pagamento no futuro.
“Desde fevereiro, março… vemos uma elevação do chamado risco Brasil. Olhando o CDS [credit default swap, que mede a chance que o mercado vê de o Brasil não arcar com suas dívidas], ele está no maior preço do ano”, diz Rafael Perretti, economista e trader da Clear Corretora.
Segundo ele, a preocupação com o fato de o governo poder “gastar mais” gerou uma “desancoragem fiscal”. Assim, o mercado passou a estimar maiores despesas, sem uma contrapartida de receitas, para fechar as contas.
Isso tudo, por sua vez, elevou também as expectativas de inflação para o Brasil. Essa perspectiva de alta dos preços é chamada de “desancoragem inflacionária”. Com inflação mais alta, o Banco Central precisa deixar os juros elevados por mais tempo.
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2. Ruídos políticos
As falas críticas de Lula contra o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, pressionam o real frente ao dólar, bem como declarações do mandatário máximo do país relacionadas ao aumento de gastos.
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Ademais, entre os fatores locais, está a mudança da meta fiscal para 2025 e a troca da presidência da Petrobras, elevando a percepção de risco – o que impacta diretamente na desvalorização do real frente ao dólar –, levando à saída de investidores estrangeiros.
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3. Argentina melhorando
Se por uma lado há uma piora na percepção dos investidores e estrangeiros em relação ao Brasil, o movimento é inverso na Argentina. Cabe, ressaltar, é claro, a situação econômica no país vizinho segue extremamente delicada – por isso, qualquer melhoria acaba se destacando.
Especialistas destacam, contudo, que a melhoria na percepção de risco argentina está acompanhada do avanço de algumas reformas econômicas, propostas pelo governo de Javier Milei.
“A Argentina está em crise profunda há muito tempo. O governo Milei entrou com algumas medidas de corte de salários, de redução de ministérios. Ele está fazendo um ajuste importante lá do lado fiscal. A inflação, apesar de ainda alta, está desacelerando. De alguma forma, o país colhe bons frutos”, afirma Alex Agostini, economista chefe da Austin Rating.
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O especialista da Austin menciona que os dólares vêm entrando no país vizinho, seja pela ajuda do Fundo Monetário Internacional (FMI) ou pela melhora da percepção de risco. Investidores, com as mudanças, se sentem mais confortáveis em emprestar para os “hermanos” e a Bolsa da Argentina, em parte também por isso, é uma das que mais valoriza em 2024.
“Isso melhora a percepção de risco de investidores, de agentes econômicos em relação à Argentina, apesar de ela continuar alta. O peso ainda se desvaloriza, como as outras moedas emergentes, porém desvaloriza menos do que o real”, pontua o economista da Austin.
4. Taxa de juros nos EUA pesa sobre emergentes
Assombrando os países emergentes mundo a fora estão os juros nos Estados Unidos, que encontram-se acima de 5% – uma taxa, considerando o histórico do país, extremamente alta.
“A política monetária dos EUA tem exercido papel significativo no câmbio. As taxas de juros altas por lá atraem recursos para o país, ajudando a valorizar o dólar. Os recursos saem do Brasil e de outros emergentes para serem alocados nos EUA e fazem com que a nossa moeda desvalorize também”, contextualiza Felipe Pontes, diretor de gestão de patrimônio da Avantgarde Asset Management.
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“Os juros americanos são considerados a taxa livre de risco do mundo. E se a gente for comparar, os juros nos Estados Unidos estão na casa dos 5,5% enquanto os juros no Brasil estão em 10,5%. Há um spread de 5 pontos porcentuais, o que é baixo historicamente, o que causa, portanto, uma fuga de capital”, explica Enrico Cozzolino, head de análise da Levante.
5. Risco geopolítico
Ainda no cenário internacional, o dólar vem se valorizando mundialmente por conta do maior risco geopolítico. Em 2024, em alguns momentos, as guerra que acontecem pelo mundo ameaçaram escalar.
“Temos tensões geopolíticas que ainda não foram superadas. Por enquanto Rússia e Ucrânia ainda estão em guerra e há também o conflito no Oriente Médio. Isso também preocupa os investidores e ajuda a desvalorizar as moedas emergentes”, comenta Agostini.
Quando há risco de conflitos escalarem, investidores também acabam por optar pela segurança oferecida pelos Estados Unidos, a maior potência econômica global.
Por que o real se desvaloriza mais que peso argentino?
Em suma, como os investidores estão mais preocupados com a capacidade de pagamento no longo prazo das dívidas no Brasil – sobretudo pelas altas taxas de juros –, retiraram recursos daqui, gerando uma desvalorização do real, que há cinco semanas cai em relação ao dólar. Ademais, pesam os ruídos políticos.
Por outro lado, o país vizinho vem buscando medidas de austeridade fiscal, mesmo com grande sacrifício social, o que ajuda o peso argentino a conter sua desvalorização frente ao dólar.
Por fim, o dólar se valoriza em relação às moedas globais porque as taxas de juros internas nos Estados Unidos estão em patamares elevadíssimos, bem como há riscos geopolíticos, que mexem com a dinâmica econômica internacional.
Dessa forma, investidores internacionais retiram dinheiro de países emergentes, por exemplo, para aplicarem nos EUA. E, no momento, como se vê, a retirada vem sendo mais intensa pela moeda brasileira.
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